Vinicius Pinotti, diretor de futebol, e Leco durante treino do São Paulo no CT da Barra Funda, em São Paulo SP 27/06/2017 Foto: Sergio Barzaghi/Gazeta Press

Michael Beale trabalhava nas categorias de base do Liverpool quando conheceu Rogério Ceni. Não demorou muito, aceitou a oferta do ex-goleiro, que o convidou para ser o seu auxiliar no São Paulo. Aquela foi a primeira oportunidade de Ceni na área técnica, e também possibilitou ao inglês realizar o sonho de desbravar terras não anglicanas no futebol.

Entretanto, aquela temporada de 2017 ficou marcada por uma sucessão de decisões polêmicas por parte da diretoria são-paulina e o resultado mais traumático para o torcedor foi ver Ceni, o maior ídolo do clube, ser demitido. Pouco antes, e já desiludido especialmente com o excesso de vendas feitas pelo Tricolor, Beale deixou o Brasil para retornar à Europa.

Em entrevista exclusiva para a Goal, Beale, que hoje é auxiliar do também mítico Steven Gerrard (ex-Liverpool) no Rangers, da Escócia, relembrou os seus intensos seis meses de Brasil.

“Eu deixei o São Paulo porque eles venderam vários dos nossos melhores jogadores e eu não conseguia enxergar aonde queriam chegar com este projeto. Foi a minha primeira experiência no futebol profissional”, afirmou.

Naquele ano, o Tricolor negociou vários de seus principais jogadores, como foi o caso do zagueiro Maicon, ao mesmo tempo em que joias do quilate de David Neres e Eder Militão também seriam vendidos.

“Só importava vender (os jogadores) no Brasil, porque não é uma liga com muito dinheiro. Eu não conseguia entender”.

“Achei difícil vender o Eder Militão para o Porto, para logo depois ele ir para o Real Madrid. Eu não o queria por apenas 10 ou 15 jogos, queria por mais tempo. Nós vendemos o David Neres para o Ajax, outros dois para o Lille, vendemos o Maicon para o Galatasaray, o João para a Atalanta. Foi muito difícil distinguir o caminho que estavam traçando”.

Beale, aliás, não poupou elogios a Eder Militão. O jogador, hoje lembrado nas convocações da seleção brasileira, chegou a ser até mesmo comparado a Trent Alexander-Arnold, do Liverpool – que apesar de ter sido meia durante praticamente toda a categoria de base, mostrou qualidade na lateral e por ali acabou pavimentando seu caminho rumo ao estrelato.

“Ele era um bom jogador e o Liverpool já sabia a respeito do Eder, por isso me pediu para ficar de olho nele”, disse à Goal. “O Eder sempre foi um bom jogador, sendo um zagueiro que jogava como volante. Nós escalamos ele ou no lado direito da zaga ou na lateral só porque ele estava evoluindo na posição”.

“Eder fazia parecido com o que Trent (Alexander-Arnold) está fazendo agora. Torcíamos por ele, mas às vezes não dá para ver o quão rápido eles fazem as coisas”.

“O Eder foi para o Porto, que ajudou muito em sua mudança para a Europa. Ele teve dois anos fantásticos da Europa e agora, no Real Madrid, está encontrando dificuldades. Ele está brigando por posição com os melhores do mundo, como Varane e (Sergio) Ramos”.

“Ele vai aprender, vai crescer e ficar melhor dia após dia. Já é um jogador de seleção brasileira, joga pela seleção mais mítica do mundo. Eu fico apenas sorrindo por ter 1% de impacto na carreira do Eder, estava por perto quando ajudamos ele a estrear no time, então fico orgulhoso disso”.

Apesar de ter considerado o futebol jogado no Brasil como “taticamente ingênuo” por vezes, e de sua história no São Paulo não ter seguido o roteiro esperado, Beale tem boas memórias dos meses em que trabalhou no Tricolor do Morumbi.

 “Ainda assim, o trabalho diário no Brasil foi inacreditável e me levou para um outro nível. Eu adorava os jogos fora de casa contra Santos, Palmeiras e viajar pelo país, treinar jogadores brasileiros. As pessoas que eu conheci e as experiências que tive são muito difíceis de se explicar, porque as pessoas não vivenciaram isso”.

“É puro futebol, com atmosfera. É ofensivo, mas às vezes taticamente ingênuo. Eu adorava o talento. Eu saí de forma apressada, mas parecia a decisão correta no momento e estou feliz com o que aconteceu comigo depois”.

“Que oportunidade. Um estádio de 67 mil lugares, menor em tamanho apenas do que o Maracanã. O meu terceiro jogo foi na Flórida, contra o River Plate. Um treinador inglês! Eu olho para trás e sinto saudades, sinto muitas saudades”.

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