Depois de liderar o Brasileirão por 12 rodadas, o São Paulo entrou de cabeça em uma crise ao ser goleado pelo Internacional por 5 a 1, na última quarta-feira (20), no Morumbi, cedendo a ponta da competição. Para além da derrocada são-paulina em campo, o time está cercado por uma série de problemas fora das quatro linhas, como dívidas com os jogadores e uma transição conturbada entre diretorias nos bastidores.

O ex-presidente Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, deixou o São Paulo no último dia 31 de dezembro. Julio Casares assumiu no primeiro dia de 2021, deu continuidade ao trabalho de Fernando Diniz e garantiu a permanência de Raí até fevereiro como executivo de futebol. Mas, numa ampla reforma administrativa no clube, promoveu as saídas de Diego Lugano e Alexandre Pássaro do departamento. O conselheiro Carlos Belmonte passou a atuar como o responsável pela área.

Pássaro era, há anos, o homem forte de fato do futebol tricolor. Advogado de formação, foi quem conduziu a negociação de acordos de redução de pagamentos de salários e diretos de imagem durante pandemia da covid-19. Quando o clube não teve caixa para honrar os compromissos do acordo e atrasou pagamentos para o elenco, foi o dirigente responsável pela interlocução, detalhando a situação a vários atletas e empresários.

Embora tivesse uma avaliação mista de seu trabalho e enfrentasse detratores dentro do próprio São Paulo, Pássaro era um dos principais elos entre o campo e os escritórios do Morumbi. Tinha a confiança dos jogadores —quando deixou o clube, mais de dez atletas que passaram pelo clube foram às redes sociais e se manifestaram em despedida. Em entrevista coletiva ontem (21), Daniel Alves lamentou a demissão.

“A única pessoa que gostaria que tivesse continuado também é o Pássaro. Não gostaria que saísse neste momento. Ele tomou porrada para caramba, como a gente tomou, e no momento que a gente poderia ter algo, ele teve que nos deixar. Eu, particularmente, gostaria que continuasse com a gente. As decisões foram tomadas e a gente tem que respeitar”, disse o jogador.

O UOL Esporte apurou que Daniel não está sozinho na opinião. Mais do que lamentar a saída, diversas fontes ouvidas pela reportagem relatam um vácuo na relação entre CT e diretoria com a saída de Pássaro e a transição entre gestões. Três pessoas diferentes afirmam que, na virada do ano, o clube deixou de depositar valores relativos a algumas pendências financeiras com alguns atletas.

Jogadores e empresários ficaram sem saber como proceder. Raí, também com data marcada para deixar o clube (ao final do Brasileirão), participa cada vez menos das decisões na nova gestão. Mesmo dentre os que defendiam a saída de Pássaro, há o discurso de que ela deveria ter sido promovida só após o fim do campeonato.

Internamente, pessoas ligadas à cúpula do São Paulo afirmam que a saída do dirigente passou justamente pelo acumulo de dívidas e estouros orçamentários na gestão anterior do ex-presidente Leco. O argumento é de que a atuação de Pássaro à frente das negociações de contenção de dívidas não era razão para interferir no processo natural de troca de comando do futebol no início de uma nova gestão. Para a direção, o time de futebol há que ser profissional e manter o mesmo desempenho mesmo sob direção de outras pessoas.

O São Paulo não admite, mas tem dívidas com quase todos os atletas, e elas ultrapassam os limites do acordo feito no ano passado. Os salários em carteira estão em dia dentro do combinado, mas parte dos direitos de imagem e outras pendências que deveriam ter sido quitadas no ano passado não foram pagas.

Clima de incerteza para Diniz e ruídos de reformulação

As demissões de Pássaro e Lugano aliadas à promessa de campanha de Casares de “reestruturar a Barra Funda” geraram um clima de incerteza no Centro de Treinamento. Funcionários de diferentes escalões do clube já dizem ter sido informados de que uma grande reformulação deve acontecer a partir de fevereiro e temem que seus dias estejam contados.

“Estaremos avaliando tudo o que acontece no futebol, não faremos movimentos bruscos, que atrapalhem o elenco, mas faremos o que tem que ser feito. Eu preciso realizar o que o sócio, o torcedor e os conselheiros aprovaram, que é o plano de gestão que passa por meritocracia e reestruturação profunda da Barra Funda. Respeitando as pessoas e os profissionais, mas dizendo que o São Paulo precisa mudar”, disse Casares, em dezembro do ano passado.

Fontes ouvidas pelo UOL Esporte —muitas delas favoráveis à planejada reestruturação do CT da Barra Funda— fazem críticas ao fato de o assunto ter entrado no radar de funcionários e no ambiente do CT com o clube em plena disputa do título brasileiro.

O ruído chega também à comissão técnica. Embora a nova diretoria tenha demonstrado apoio público a Fernando Diniz, a reportagem apurou que o técnico sabe, há meses, que sua chance de permanência passa pela conquista do título brasileiro. O comandante são-paulino conviveu e ainda convive com duas sombras de dois ídolos históricos são-paulinos: ao longo do ano passado, diversos veículos de imprensa noticiaram repetidamente que Rogério Ceni era o nome favorito para substituí-lo.

Neste ano, ele ganhou a companhia de Muricy Ramalho, que assumiu o posto de coordenador técnico. Depois da goleada de quarta diante do Internacional, diversos torcedores nas redes sociais clamavam para que Muricy assumisse o clube na reta final do Brasileiro. O agora coordenador afirma ter uma cláusula contratual que o impediria de ser treinador.

UOL