O espanto com as últimas atuações do São Paulo são injustificáveis, o olhar mais analítico, menos apaixonado, notou desde o primeiro jogo do Paulistão que as coisas não estavam bem. A péssima e morosa apresentação diante da Ponte Preta, no último sábado, foi apenas mais uma neste ano de 2019, que começou com uma expectativa altíssima para o Tricolor, mas que aos poucos vê a realidade apagando o fogo da já conhecida empolgação, alimentada também pela mídia ‘especializada’.

Procurar culpados após a derrota por 1 a 0 para a Ponte, ou depois de perder para o Talleres, na Argentina, por 2 a 0, é injusto. Parece até que os problemas apareceram da noite para o dia e antes o time vivia um mar de rosas. Se alguém pensou assim, será que não parou para se perguntar: “Quando é que o São Paulo jogou bem em 2019?”. Caso esse questionamento não tenha passado pela mente de um são-paulino, provavelmente esse cidadão caiu na conversa da imprensa apaixonada.

E esse papo que insiste em induzir as pessoas a fugirem da realidade começou no fim do ano passado, quando o clube mostrou força no mercado ao contratar Pablo por um valor recorde, na época havia a concorrência de outros predadores da janela, como o Flamengo. Para uma agremiação carente de títulos e que assiste aos rivais levantarem taças, isso serviu como comemoração e perspectiva de uma temporada melhor, algo que aumentou quando houve a contratação do goleiro Tiago Volpi e o anúncio do retorno do ídolo Hernanes.

De fato, na teoria, são reforços de peso para um clube que retorna à Copa Libertadores e precisa brigar por títulos, mas como tem acontecido há alguns anos, a empolgação extrapolou os limites da razoabilidade, torcedores começaram a contar vitória antes do tempo, os setores mais apaixonados da imprensa esportiva já colocavam o time no mesmo patamar de Palmeiras e Flamengo e o próprio clube parecia mergulhar de cabeça nesse perigoso mar da realidade alternativa.

Foi assim no Brasileirão do ano passado, quando a equipe liderava a competição e dava a impressão de acreditar que levantar a taça era uma questão de tempo, algo que, como todos puderam ver, estava bem longe de ser concretizado. Esse movimento foi visto de dentro para fora e de fora para dentro, contaminando um ambiente que já não era mil maravilhas e carecia de muita coisa para ser campeão. Quando caíram na real, resolveram demitir Diego Aguirre, que havia feito um milagre possibilitando ao São Paulo a disputa de um título.

Sem poder gritar “é campeão”, o objetivo era garantir, pelo menos, uma vaga direta na fase de grupos da Copa Libertadores e André Jardine foi o escolhido para a missão que, pelo que os dirigentes deram a entender, não poderia ser cumprida por Aguirre. A vaga direta não veio, e as atuações pioraram, mesmo assim houve a garantia de que o ex-auxiliar seria o técnico para 2019. Com dois mata-matas logo no começo da temporada, a pressão por resultados viria logo cedo.

Um time que não jogava bem em 2018, que manteve o treinador que não havia correspondido e que teria uma pré-temporada queimando etapas, ainda foi cumprir sua agenda na Florida Cup, onde foi derrotado duas vezes em outras duas atuações sem consistência. Naquele momento já era para ter percebido que muitas coisas estavam erradas, ou melhor, continuavam erradas. Mesmo com tudo isso, ainda havia empolgação, embora boa parte dos torcedores são-paulinos não estava tomada pela ilusão.

O Paulistão começou e apenas duas vitórias, contra equipes consideradas pequenas, foram suficientes para o show de empolgação voltar. No primeiro duelo, contra o Mirassol, o Tricolor saiu atrás no placar e jogava muito mal, mas ‘achou’ o empate ainda na primeira etapa, e no começo do segundo tempo impôs sua qualidade para virar. Em seguida, o adversário teve um homem expulso e, com um a mais, bastou jogar com intensidade mais dez minutos para construir a goleada por 4 a 1.

A imprensa apaixonada ficou em polvorosa, voltou a elogiar o bom futebol (!!!) do time e como Pablo já tinha se encaixado. Com a volta de Hernanes, após lesão, uma nova máquina estaria formada. O sentimento era esse, não adianta negar. E ficou intensificado com o 3 a 0 diante do Novorizontino, que foi prejudicado por vacilos infelizes do goleiro Vagner. Nada, porém, de boa atuação são-paulina, time foi apenas eficiente e tinha essa obrigação pela sua grandeza. É difícil analisar assim quando o coração está no teclado ou na ponta do microfone.

Aí veio outra ducha de água fria com a derrota para o Santos, que na verdade foi uma avalanche gelada. O atropelamento santista no Pacaembu mostrou que a empolgação diante das últimas partidas nada mais era do que uma alucinação coletiva. O Peixe, quase sem reforços, sem estrelas, com técnico estrangeiro recém-chegado e desfalcado pelo mercado de transferências, teve enorme superioridade em relação a um trabalho que veio do ano anterior e foi reforçado.

Ainda houve o revés para o Guarani, também no Pacaembu, depois uma vitória sem brilho diante do São Bento.  Além de as já citadas derrotas para o Talleres e para a Ponte Preta, que definitivamente colocaram todos os envolvidos com os pés no chão. Todos eles cientes de que será muito difícil uma classificação para a próxima fase da Libertadores, mas acima de tudo com a percepção de que isso já era notório bem antes de esses resultados negativos aparecerem e as ilusões serem disseminadas.

Quem não consegue enxergar o próprio umbigo, jamais conseguirá dar passos à frente, seja no comando de um clube, seja na vida pessoal. Os erros não começaram na última quarta-feira, os erros são os mesmos de 2017, de 2018… Encontrar beleza onde não há, romantizar o que na verdade é um drama, contar vantagem antes de ter as cartas na mão e cair no conto daqueles que deixam a razão de lado para analisar com o coração. Ninguém está isento da culpa. Menos empolgação e mais realidade é o que São Paulo precisa.

Lance!