O campeonato não acabou. Ainda restam nove rodadas, com 27 pontos em aberto. Considerando a matemática e os sete pontos de distância para o líder Palmeiras ainda existe uma esperança na briga pelo título, no entanto, quando se analisa o futebol praticado, a esperança murcha.

Após liderar o Brasileiro com uma campanha bem consistente no primeiro turno, nas últimas rodadas, o São Paulo foi definhando na tabela com o surgimento de falhas em setores antes considerados estáveis, como no caso do sistema defensivo.

A frustração ao despencar da liderança para a quarta posição, conselheiros e torcedores começaram a ecoar um pedido de demissão para o técnico Aguirre. Não só o técnico Aguirre começou a ser questionado como também os diretores de futebol Raí, Lugano e Ricardo Rocha. Mas a questão que se levanta, neste momento, é se a cobrança tem fundamento.

Em tempos de pós-verdade, há que se ressaltar que há um ano o São Paulo era um time que lutava para não cair, que só não vivenciou o maior vexame de sua história, graças ao talento de Hernanes e a força de sua torcida.

A torcida, mais que ninguém, tem todo o direito de cobrar uma reação da equipe nessa reta final de Brasileirão 2018, no entanto, talvez uma cobrança exacerbada só afastaria ainda mais o São Paulo de um título que não vem há noves anos no torneio nacional.

Se o sentimento do ano passado era o de livrar para iniciar uma reconstrução em 2018, não se pode negar que o São Paulo vem se reerguendo, provas disso se estabelecem com as rodadas de liderança no Brasileirão deste ano, a quarta posição atual (que dá vaga direta na Libertadores – Torneio dos sonhos de todo Tricolor) e a formação de um elenco muito melhor.

Aguirre faz o que pode com um elenco curto, sofre com baixas de jogadores veteranos que estão no limite físico e sofre com o imponderável, como a contusão de Everton, motorzinho do time. Na base “do que temos para hoje”, é inegável que Aguirre faz um bom trabalho.

As limitações quantitativas do elenco obrigaram Aguirre a improvisar nas laterais, escalando Rodrigo Caio, Arboleda e Hudson. O São Paulo reforçou o elenco, mas ainda existem brechas.

Não há mais falta de brio e raça no São Paulo de Aguirre. O que existem são limitações. O futebol pode não ser o mais vistoso, porém, nunca é demais lembrar que o time há anos não fora – com o perdão do trocadilho – tão aguerrido, uma cobrança insistente em relação aos elencos apáticos de outros campeonatos, onde ganhar ou perder a expressão era a mesma.

Considerando a bola jogada, os confrontos finais e a matemática da tabela, para o São Paulo, que vem cambaleando há anos, não seria um resultado desastroso terminar dentre os quatro primeiros e voltar à Libertadores, como um novo passo para essa etapa de reconstrução.

A sequência do São Paulo nesta reta final não é brinquedo: Atlético-PR (casa), Vitória (fora), Flamengo (casa), Corinthians (fora), Grêmio (casa), Cruzeiro (casa), Vasco (fora), Sport (casa) e Chapecoense (fora). Não seria a hora da torcida conduzir o time das arquibancadas? Se mostraram força quando o time lutava para não cair…

Em um clube que atravessou uma crise institucional profunda e ainda vive um trauma devido à ausência de títulos, há que se tomar muito cuidado para não ultrapassar o limite entre o que se projeta na mente e o que acontece de fato.

No setor do futebol, é evidente que boas medidas foram tomadas: o presidente Leco formou uma comissão técnica considerável, com Raí, Lugano e Ricardo Rocha. Essa comissão indicou Aguirre, que tornou o São Paulo competitivo e, por fim, investiu em algumas peças, tais como Everton, Nenê, Diego Souza e Bruno Peres, Everton Felipe, cumprindo etapas importantes nesse processo de reconstrução.

A frustração do torcedor é tamanha (e com razão), já que um título, há tempos não esteve tão perto das galerias de troféus do Morumbi, porém, se o torcedor parar e refletir um pouco o que foram os últimos anos e, especificamente, o ano passado, há que se constatar que aconteceu uma evolução.

Trocar Aguirre agora seria insensatez, para não dizer burrice, independente da posição da tabela final do campeonato. Se o São Paulo se classificar para a Libertadores, então, insanidade.

É também fato que Aguirre não pode ficar refém de um futebol reativo, mas, em contrapartida, é necessário um elenco mais amplo, com maior diversidade para ampliar as linhas das planilhas táticas.

As bases para um novo São Paulo estão sendo construídas, o que não pode predominar agora é um sentimento de “terra arrasada”, que só colocaria o clube novamente em uma estaca zero.

Crônicas do Morumbi – Ricardo Flaitt