O presidente Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, e o vice-presidente Roberto Natel estão rachados no São Paulo. A relação entre os dois é meramente formal e protocolar. Embora exista respeito durante encontros, não há qualquer aproximação dos dois lados.

Os motivos apontados para o racha são variados. O GloboEsporte.comouviu diferentes pessoas que indicam as razões para a relação estremecer. Alguns episódios de bastidores ajudam a explicar o fogo cruzado entre presidente e vice.

A chapa da situação, de Leco e Natel, venceu a da oposição, encabeçada por José Eduardo Mesquita Pimenta (hoje membro do Conselho de Administração), por 124 votos a 101, em abril de 2017. O mandato vale até 2020, e o atual presidente não poderá tentar a reeleição.

Ponto de vista de pessoas ligadas ao presidente

A principal acusação a Natel é de supostamente tentar desestabilizar a gestão desde o início. O vice é visto como um antagonista, cujas ações seriam motivadas por razões pessoais e que não contribuiriam em nenhum momento para o São Paulo. Em resumo, ele é apontado como uma pessoa que opera contra a atual diretoria, mas não pode ser destituído do cargo, já que foi eleito.

As recentes articulações políticas de Natel (veja mais abaixo) agitaram os bastidores. Não há confiança no vice para nomeá-lo representante do clube em eventos nos quais o presidente não possa ir, como por exemplo na CBF ou na Federação Paulista de Futebol, o que seria uma atribuição normal do cargo.

Nesse sentido, o histórico de desembarque da gestão em setembro 2016 é citado. Na ocasião, pouco depois da eliminação do São Paulo para o Juventude, na Copa do Brasil, Natel deixou o cargo de vice por querer se candidatar à presidência, mas depois desistiu e voltou a apoiar Leco. Há uma corrente que acredita que o vice tem a aspiração de tumultuar em busca do poder.

Ponto de vista de pessoas ligadas ao vice

Existe a crença de que Leco não teria absorvido completamente o fato de Natel ter deixado a gestão em 2016, quando o vice decidiu ser candidato à presidência e depois recuou. Os dois voltaram a se unir antes da eleição de 2017. Os votos trazidos por Natel contribuíram para a vitória da chapa.

A impressão, porém, é de que nunca houve espaço para aproximação a partir do início da gestão. O fato de o vice não ser escolhido para representar o clube em momentos de ausência do presidente também é citado. Natel não participa das decisões do dia a dia do Tricolor.

Há muitas discordâncias internas entre vice e presidente, mas Natel não pretende renunciar ao cargo. O dirigente entende que dar uma opinião contrária não quer dizer necessariamente ser de oposição. Houve choques anteriores entre Natel e Leco, como em indicações de diretores executivos e membros do Conselho de Administração.

Encontro com opositores

Dias antes de uma reunião de fevereiro do Conselho Deliberativo, Roberto Natel se encontrou com Douglas Schwartzmann e Dorival Decoussau, conselheiros opositores a Leco, em um bar próximo ao estádio do Morumbi.

Um dos assuntos da conversa foi a votação da nova comissão disciplinar, responsável por julgar os casos que envolvem os associados do clube. O vice-presidente Natel admite ter se encontrado com os conselheiros, mas aponta aproveitamento político em cima do fato.

– Usaram isso politicamente. A partir do momento em que vou a um local público estou sendo transparente. Quem me viu lá está usando isso com uma conotação política. Não faço nada escondido, faço pelo bem do São Paulo. O dia em que não puder fazer mais o bem vou embora. Sempre que houver uma reivindicação vou ouvir. Fico tranquilo, porque o tempo vai mostrar quem está com a razão – disse Natel.

– Foi para sentar e conversar em quem eu ia votar, quem achava que era justo. Desde o primeiro momento falei que eram pessoas que iriam olhar para os sócios. Independentemente de tudo, ali é o lado social. Entenda uma coisa: não vou assinar uma cartilha com coisas goela abaixo. Vou ver o que é melhor para o São Paulo. Isso é que foi conversado. Tanto que votei em pessoas diferentes. Votei em quem acredito – completou Natel.

No Conselho, foram eleitos cinco nomes: dois ligados à situação (Adolfo Machado e Rodrigo Martinez), dois da oposição (Mauricio Sá e David Fuchs) e um quinto elemento (Luis Braga).

Braga é considerado “neutro” pela situação, pois pertence a um grupo político da base aliada (Fidelidade Tricolor). Por outro lado, também é visto como de oposição pela própria oposição, pois um dos coordenadores do grupo, Carlos Henrique Sadi, rompeu com Leco.

Articulação política em meio às semifinais

Natel colheu assinaturas de conselheiros na véspera (no clube social) e no dia do jogo (no estádio) entre São Paulo e Corinthians, no Morumbi, pela primeira partida das semifinais do Paulistão. O Tricolor venceu o jogo por 1 a 0.

O vice quer pedir uma reunião extraordinária para acabar com a remuneração de diretores executivos que são ao mesmo tempo conselheiros licenciados, algo permitido pelo estatuto. A ideia é que eles abram mão do cargo de conselheiros, ao invés de se afastarem. Na visão de Natel a pessoa deve escolher: ser remunerado (como diretor) ou continuar como conselheiro.

Mas há uma discussão em andamento nesse sentido no Conselho Deliberativo desde fevereiro, promovida por três grupos políticos (Legião, Participação e Vanguarda) da base aliada a Leco. Hoje há quatro dos oito diretores nessa condição.

Após a reforma estatutária, ficou permitida a remuneração do presidente e de diretores executivos que tenham dedicação exclusiva ao São Paulo. O cargo de vice-presidente não tem salário, motivo de controvérsia.

Existe uma versão nos bastidores de que essa é a motivação de Natel para confrontar a remuneração dos executivos que são conselheiros licenciados, e que o próprio vice já teria dito que gostaria de receber salário. Natel, no entanto, nega veementemente.

– Isso é desculpa, papo furado. Não tem cabimento. O estatuto foi feito lá atrás. Se fosse esse o intuito, eu era um dos membros. Abri mão e pedi para sair. Entrou o Marcelinho Portugal Gouvêa (na comissão). Tenho a consciência limpa nesse sentido. Estava entre os membros da reforma de estatuto. Houve alterações e poderia ter colocado isso – disse.

Apesar da discussão estar aberta no Conselho, Natel argumenta que o processo conduzido dessa maneira levaria muito tempo e pode ser acelerado com a extraordinária. Ele, inclusive, deverá entregar uma lista com algo entre 80 e 90 nomes na segunda-feira com o pedido.

A ação do vice em meio ao momento de definição da equipe no Paulistão revoltou conselheiros da situação. A impressão é de que ele desgastou a própria imagem com a iniciativa em uma hora errada.

Nesse contexto, a ação foi vista como uma nova tentativa de desestabilizar a gestão. Há o argumento de que uma mudança como essa no estatuto não requer apenas uma reunião extraordinária, mas também passaria por uma comissão legislativa, pelo Conselho Consultivo (formado por ex-presidentes), pelo Conselho de Administração e por fim teria de ser aprovada em uma assembleia geral de sócios.

GE