Há pouco menos de um mês, logo depois do Corinthians conquistar o título do Brasileiro antecipadamente, comentei a respeito (aqui) e no título do post já expressei o que pensava: Um título com dedo de gestão.

Gestão de futebol, como deixo claro no decorrer do texto, a gestão que permitiu ao time ter somente 6 treinadores num período de dez anos. Mais importante: três desses treinadores ficaram à frente da equipe por praticamente nove anos.

Dias depois, logo depois de o São Paulo conseguir sua manutenção na 1ª divisão do futebol brasileiro, postei a respeito e, naturalmente, comparei com a situação corintiana (aqui).

O título desse post também fala em gestão: “São Paulo escapou do rebaixamento… Apesar de sua gestão”.

Os títulos já mostram a diferença.

Os números, mostram mais ainda.

No mesmo período de 10 anos, 15 – quinze – treinadores e mais Milton Cruz, o “interino permanente” e outros dois interinos, passaram pelo Morumbi.

No post de hoje vou avançar a comparação com o mesmo Corinthians e os outros dois grandes paulistas – Palmeiras e Santos – mostrando os títulos conquistados por esses times e o quanto os clubes receberam de 2009 a 2016 e o quanto gastaram o futebol nesse período.

Importante: todos os números são estritamente dos balanços dos clubes. Os valores de receitas incluem as transferências de atletas. O custo do futebol é o custo lançado pelos próprios clubes em seus balanços na rubrica “Despesas com futebol profissional”. São, portanto, números públicos e disponíveis para qualquer pessoa.

A correção de valores foi feita pelo IGP-M.

Gestão sem títulos

Entre 1º de janeiro de 2009 e o próximo dia 31, terão decorrido 9 anos completos.

Nesse período, sem considerar as receitas e custos do futebol do ano corrente, que só conheceremos no final de abril com a publicação dos balanços, o Corinthians teve uma receita total corrigida (até 30 de novembro último) pelo IGP-M de quase 3 bilhões de reais.

A receita total corrigida do São Paulo foi um pouco menor: pouco mais de 2,5 bilhões de reais.

No decorrer desse mesmo período o Corinthians gastou 2,15 bilhões com seu futebol e o São Paulo um pouco menos, quase dois bilhões.

Poderíamos dizer que os dois times de futebol dos dois clubes seguiram parelhos no decorrer desses nove anos, não? Afinal, tanto as receitas como, principalmente, os gastos com o futebol andaram muito próximos, quase parelhos.

Olhando para o histórico de conquistas desse período, todavia, veremos uma diferença brutal, enorme, entre os dois times, entre os dois clubes.

Enquanto o Corinthians conquistou 9 títulos, 5 dos quais de primeira grandeza, o São Paulo conquistou apenas um, um único e solitário título e, mesmo assim, de importância secundária.

Considero como primeira grandeza os títulos brasileiro, continental e mundial, ao passo que as outras duas copas e estaduais são, em minha visão, secundários.

Uma temporada sem conquistas acontece até aos melhores times.

Duas temporadas seguidas sem conquistas também acontecem…

Três temporadas consecutivas sem nada ganhar e, ainda por cima, ficando fora de edições da principal copa continental já é um claro sinal de que algo vai muito mal…

Pior ainda quando o flerte com o rebaixamento de divisão se torna corriqueiro.

Muitíssimo mal.

Muitos fatores podem explicar uma, duas, três temporadas seguidas sem sucesso.

O acaso… Renovação de elenco… Problemas de relacionamento… Problemas entre o treinador e o elenco… Trabalho equivocado do treinador… Problemas financeiros levando a atrasos nos pagamentos…

Falando em treinador, lembre, amigo leitor, do início desse post.

Voltando ao post de hoje: nove temporadas de insucessos demonstram claramente que o buraco é mais embaixo, como se diz popularmente… Ou mais para cima, muito mais…

Nove temporadas seguidas de insucessos demonstram com absoluta clareza problemas graves de gestão. Depois do impressionante número de treinadores que passaram pelo Morumbi, vamos ver números de títulos conquistados e, no final, o dinheiro que circulou pelos clubes no período.

Vejam a tabela abaixo mostrando as conquistas dos quatro grandes paulistas nesse período:

A simples visualização já mostra o tamanho do prejuízo, da diferença entre um time e outro.

A crueldade nua e expressiva dos números

Logo no início desse post falei dos números de receita total e custos do futebol de Corinthians e São Paulo. Na próxima tabela teremos os valores nominais e os valores corrigidos, não só dos dois clubes citados na abertura, mas também de Palmeiras e Santos, fechando o grupo dos quatro grandes paulistas.

Reparem que o fracasso da gestão do futebol no Morumbi fica ainda mais evidente com os números dos outros dois grandes, que tiveram receitas totais e gastos com futebol sensivelmente inferiores aos de Corinthians e São Paulo, principalmente o Santos, destacando, entretanto, que nos últimos três anos os valores palmeirenses evoluíram sensivelmente, com o aporte significativo de valores de seu patrocinador principal.

Um grande abacaxi para Raí

Essa é, em síntese, a situação que Raí irá enfrentar.

E que ele já conhece, não só como ex-jogador e ex-funcionário (em 2002), mas também como membro do Conselho de Administração do clube.

Num clube de futebol, mesmo os mais vitoriosos, as pressões são intensas e permanentes, sempre de difícil administração.

Na Europa, de clubes majoritariamente com formato de empresa, com um ou mais donos, a administração dessas pressões e tensões é menos difícil… geralmente. E dizer “menos difícil” nem por sonho chega perto de algo como “fácil”. Boa parte dessas menores dificuldades é devida ao fato de o gestor não precisar vencer eleição para permanecer no cargo.

No Brasil é o oposto: os clubes, na quase totalidade, e os grandes na totalidade são organizações societárias, sem fins lucrativos, com interesses outros além do futebol, o que faz com que, muitas vezes, o tamanho e a limpeza da piscina seja mais importante na eleição de um presidente do que as conquistas do time de futebol.

Vemos, também, que o grande compromisso dos presidentes é… conquistar a reeleição. Ou trabalhar para eleger alguém próximo.

Nessas horas, trocar de treinador costuma ser medida que traz resultados políticos e ajuda os dirigentes a se manterem no poder. Porque a responsabilização pelo fracasso é tirada das costas da direção e transferida para o treinador de plantão.

E os dirigentes vão ficando e os treinadores seguem sendo trocados e os atletas negociados, porque essa é outra faceta importante: quanto maior a rotatividade de atletas, menor é a consistência dos times e menor, por consequência, a qualidade dos times e a conquista de títulos.

É, Raí, será dura a sua missão. Boa sorte.

Emerson Gonçalves