Foram 352 jogos, oito gols e seis títulos, dentre eles dois Brasileiros, uma Libertadores e um Mundial. Ralf sabe a sua dimensão no Corinthians e está disposto a preservar isso.

Aos 33 anos, o volante está disponível no mercado, mas diz que não aceitaria jogar em outro clube de São Paulo que não fosse o Timão.

Embora tenha se desligado do Beijing Guoan, Ralf deseja permanecer na China. E engana-se quem pensa que isso é apenas pela grana que os asiáticos costumam pagar. O jogador diz estar adaptado e feliz do outro lado do planeta.

– Depois que você sai, não quer voltar tão cedo – diz Ralf, que aponta a privacidade e a liberdade nas ruas como os principais atrativos daqui.

Em férias no Brasil, Ralf recebeu a reportagem do GloboEsporte.com no edifício onde mora, na Zona Leste de São Paulo, reduto corintiano. Na entrevista, o volante falou sobre o seu futuro, elogiou o sucessor no Timão, Gabriel, e lembrou como foi levantar a taça do hexa em 2015. Confira:

Por que você não renovou contrato e está de saída do Beijing Guoan?
O clube está se reformulando, tem limite de estrangeiro, e há a possibilidade de diminuir uma vaga para jogadores de fora da China, o que seria bem difícil para nós. Estão mudando muitas coisas. Antes, começava um jogador sub-23 e com cinco minutos o jogador queria tirá-lo. Já para o ano que vem esse atleta tem que terminar a partida também. Eu fiquei dois anos lá, foi maravilhoso para mim, não posso reclamar. Quando a gente assinou o contrato, foi um desafio. Saio de cabeça erguida e deixo as portas abertas.

Mesmo assim, você pretende seguir na China ou já faz planos de retornar ao Brasil?
É difícil tomar uma decisão tão cedo, tem só duas semanas que estou no Brasil. Não posso falar o que vou fazer, mas minha vontade é permanecer na China. Me adaptei muito rapidamente e tenho desejo de permanecer lá, não só pelo lado financeiro, mas também por aprendizado, a vida e crescimento profissional também.

Você já recebeu propostas?
Proposta não tem, mas sondagens, sim. Meus empresários são capacitados para isso, me representam muito bem e sabem o que é melhor para mim. Eles filtram algumas coisas, trazem outras, eu só quero curtir minha família e meus amigos neste momento.

A sua identificação com o Corinthians o impediria de jogar em outro time de São Paulo?
Por tudo o que conquistei e representei para o Corinthians e o torcedor, é difícil eu ir para um rival direto. Sou bem sincero. Hoje eu preferia seguir na China até por isso.

Você acha que poderia manchar a sua imagem como ídolo do clube?
É difícil voltar para um rival. Sempre vou ser lembrado como o Ralf do Corinthians. Não quero apagar essa história. Foi tão difícil conquistar e chegar onde cheguei. Não quero jogar tudo isso fora da noite para o dia. Por isso, se for para voltar, vai ser para um clube fora de São Paulo. Se fosse para São Paulo, teria que ser para o Corinthians.

Apesar do seu desejo de ficar na China, há chance de retorno?
Não digo que não voltaria, mas acho que só se for algo surreal, mas meu foco é lá, meu objetivo é ficar. Gostei de lá, me adaptei fácil. Tudo bem que o meu clube era da capital, o que facilita, mas eu gostei da vida no país. Eu nunca tinha saído do Brasil e para mim foi difícil. Tive propostas antes e não aceitei. Quando sai, fui até pego de surpresa. Mas era minha vontade sair do Brasil naquele momento, tanto que hoje minha cabeça é outra tendo vivido fora. Você cresce como profissional e ser humano. Isso só agrega na carreira.

Pelo que você diz, a adaptação ao futebol chinês foi muito fácil…
Eu me adaptei muito rapidamente, graças a Deus. As batalhas que enfrentei na vida foram muito mais difíceis do que as da China. Você se adapta rapidamente ao idioma, leva na mímica… E como tinha o Renato Augusto e um outro jogador que falava espanhol, a gente foi se ajudando.

O que foi mais fácil e mais difícil?
Na cultura foi sossegado, mas a alimentação foi um pouco mais difícil. Lá tinha opções de restaurantes estrangeiros, como espanhol, italiano, mexicano… Então não precisei comer tanto a comida local.

Aí quando volta ao Brasil…
Churrasco todo dia (risos). Sarapatel, feijoada, tudo.

E na questão física? Dizem que o futebol chinês é menos intenso.
Eu passei a treinar mais individualmente. Aqui eu treinava com o grupo, tinha até trabalhos mais intensos, até pelo fato de aqui jogar mais e treinar mais. Lá, se você não se cuidar, perde um pouco fisicamente. Alguns chineses não gostam de treinar. Alguns treinam pouco e outros muito, até te surpreendem. Na China eu sou até referência para alguns. Eles veem eu treinando, até pela minha idade e porte físico, e às vezes nem acreditam. Fui reconhecido na minha saída, tanto que eles não queriam que eu saísse. Sou um cara exemplar, eles só têm boas referências de mim.

Sua saída do Corinthians pegou a todos de surpresa. Você havia acabado de renovar contrato por dois anos. Como lidou com isso?
Foi tudo muito rápido e desgastante também, pois se arrastou a negociação para renovar. Assim como agora, com o clube chinês, o Corinthians deixou a renovação para ser feita em cima da hora. A gente quer acertar antes, até pra sair de férias e estar tranquilo, né? No Corinthians tive altos e baixos, acabei o ano jogando, fui o capitão, mas tive momentos em que não tive sequência. Isso foi desgastando, eles não queriam renovar, depois queriam… E eu não podia assinar nada, pois estava esperando o Corinthians. Depois que assinamos, passaram-se 10 ou 15 dias e o clube chinês cobriu a proposta. Eu estava no alto aqui, mas tinha que pensar na minha vida financeira.

Você saiu sem nem sequer conceder uma entrevista. Faltou uma despedida melhor, não acha?
Sim, até pelo reconhecimento que o torcedor teve por mim. Pela diretoria também. É claro que alguns foram ingratos, não reconheceram, mas eu entendo também. Ficou a vontade de deixar um agradecimento, porque muitos não merecem eu ter saído como foi. Mas por rede social eu acabei agradecendo e pedindo desculpa, pois tudo que conquistei foi graças ao Corinthians, pessoal e profissionalmente. Foram seis anos maravilhosos da minha vida.

Você ainda mantém contato com funcionários e jogadores do Corinthians?
Você sai e deixa as portas abertas. E tem amigos também, né? Eu tenho boas amizades. Não fui ainda no CT porque sabia que nesta quarta-feira era confraternização do grupo, churrasco, mas pretendo ir lá dar um abraço.

Acompanhou a campanha do título brasileiro? Pretende ir ao jogo de domingo?
Acompanhei de casa até agora, prefiro respeitar, vou seguir torcendo sempre pois sou grato à equipe e ao torcedor. Vou ficar torcendo sempre, mas de casa. Lá na China, o horário atrapalhava, mas eu conseguia ver alguns jogos, principalmente quando era à noite. Os jogos de tarde passavam lá de madrugada, então não dava para ver.

Você foi o capitão no último título brasileiro, em 2015. Agora, alguns esperavam que fosse o Danilo, mas o Carille escolheu o Cássio. O que achou?
A braçadeira está em boas mãos, vai ser muito bem representado. O Danilo também é um cara que dispensa comentários e até imaginava que seria ele, por tudo o que ele representa, o que faz pelo Corinthians, o profissionalismo dele… É um cara que, mesmo no banco, treina muito mais do que alguns jovens. Ele dispensa comentários. Mas o Cássio representa muito bem, é um ídolo.

Muita gente compara o Gabriel, atual camisa 5, a você. O que acha?
É difícil você se comparar com alguém. Mas o Gabriel é bom, novo ainda e tem um grande futuro pela frente. O pouco que fiquei sabendo é que ele é dedicado. Também vi alguns jogos, tive oportunidade. de enfrentá-lo quando ele estava no Botafogo e no Palmeiras. É um jogador de raça e força, que aos poucos vai colher os frutos.

Acha que são parecidos?
Ele é menor, mais leve e ágil. Eu já fazia mais a proteção dos zagueiros e cobria os laterais. Mas ele vem jogando muito bem.

GE