Num time grande que padece na zona de rebaixamento do Campeonato Brasileiro, cada elemento novo representa uma enorme esperança de mudança. Um deles é Dorival Júnior. Experiente, atual vice-campeão brasileiro com o Santos, o técnico está há pouco mais de duas semanas no São Paulo, no lugar do ídolo Rogério Ceni, demitido justamente quando a equipe entrou no Z-4.

Em entrevista ao GloboEsporte.com, além de ter confirmado a estreia de Hernanes – mais um foco de esperança para sair do buraco – no jogo deste sábado, contra o Botafogo, Dorival atribuiu o momento confuso do Tricolor à remontagem de elenco feita com o Brasileirão em curso.

 Mesmo assim, disse que é difícil entender a situação do São Paulo, que vem de temporadas ruins.

– Às vezes, não entendemos o momento que passamos, mas, de repente, pode ser aquele passo atrás que você dá para depois ter um salto ali na frente. A seriedade das pessoas que trabalham aqui dentro é muito grande, sinto essa entrega, por isso não entendemos o momento do clube.

O treinador também falou sobre Hernanes e Cueva atuando juntos, a utilização do jovem Brenner, de 17 anos, a importância de Lugano, e defendeu jogadores em momentos ruins, como o lateral-direito Bruno e o atacante Wellington Nem.

GLOBOESPORTE.COM: Você está no São Paulo há pouco mais de 15 dias. No que viu evolução? O que o deixa satisfeito e o que preocupa à essa altura do trabalho?
Dorival Júnior: 
Ainda é difícil analisar porque foram poucos períodos de trabalho, é a grande verdade. Não adianta falar que a equipe evoluiu em determinado aspecto ou regrediu em outro. Acredito que esse processo ainda demore um pouco, principalmente pela chegada de novos jogadores que ainda buscam uma ambientação. Alguns chegaram há no máximo 40 dias, o Petros há 20, o Hernanes e o Marcos Guilherme há três dias. Isso tudo deixa uma situação um pouquinho confusa, não é ideal um time como o São Paulo buscar uma montagem dentro da competição, é um risco muito grande. Temos de acelerar esse processo sabendo que não é fácil.

Você se disse preocupado com o aspecto emocional. Ao menos isso melhorou.
A confiança vai sendo recuperada a partir do momento em que os jogadores se conhecem mais como pessoas, profissionais, seres humanos, e comecem a acreditar naquilo que está sendo buscado por todos juntos. E, acima de tudo, com um ou outro resultado que colabore para dar uma liga maior. Você não vai buscar equilíbrio de equipe com dez dias de trabalho, não terá sintonia total nesse processo. Isso se alcança gradativamente porque sempre vamos enfrentar equipes num patamar um pouquinho superior em equilíbrio e harmonia de jogo. É complicado ter de alcançar essa estabilidade durante o Campeonato Brasileiro, onde todos os jogos são muito perigosos. Dificilmente você fala sobre certeza de fazer três pontos num jogo, isso é um erro muito grande.

Essa instabilidade vem de seguidas vendas e contratações do São Paulo. Acha que a diretoria já percebeu que não se pode fazer futebol assim, ou você terá de explicar a eles?
Alguns aspectos incomodam todos os clubes brasileiros. Isso, de repente, aconteceu neste momento com o São Paulo, como aconteceu em janeiro do ano passado com o Corinthians. As janelas de transferências não se equivalem, a nossa de saída é estendida, muito maior do que a de entrada. Com isso, você fica totalmente vulnerável. Um clube qualquer do mundo pode chegar, pagar a multa e levar seus jogadores. Outro aspecto é a necessidade que clubes brasileiros ainda têm de venda. Todos correm esse risco, e recompor num Brasileiro é muito complicado.

O Rodrigo Caio disse não ao Zenit. Você conversou com ele sobre a proposta?
É muito difícil uma situação como essa, o Zenit estava pagando a multa. Os clubes ficam vulneráveis em todos os sentidos. Se eles cumprissem e houvesse o acerto com o Rodrigo, estaríamos hoje sem nosso zagueiro titular, um jogador convocável, que vem crescendo de produção assustadoramente nos últimos anos. E num estalar de dedos poderíamos estar sem ele. Essa situação nos acompanhou por 20 ou 30 dias. Às vezes, não imaginamos o tamanho do prejuízo.

Você tem mais de 30 jogadores no elenco. É um número ideal? Como deixar todos motivados disputando apenas uma competição?
Não dá para definir um número porque podemos perder jogadores por lesão, como aconteceu no Santos, ano passado, com Gustavo Henrique e Luiz Felipe em 20 dias, ou em negociações. Um número ideal, disputando três competições, seria entre 26 e 28 atletas, desde que houvesse um trabalho de categorias de base, podendo usá-los a qualquer momento. Isso não acontece na Libertadores e no Paulista, por exemplo, em que há limite de inscritos. Foi um pedido nosso nas reuniões da Federação Paulista de Futebol, que tivéssemos as categorias de base abertas.

O Brenner, por exemplo, desceu para jogar a fase final da Taça BH pelo time sub-17. Você prefere que o garoto treine com a base e suba para suprir eventuais necessidades suas ou gosta de tê-lo ao seu lado o tempo inteiro, de acompanhar de perto os treinos?
Eu gosto de trabalhar vendo, mas, quando ele não for aproveitado, é fundamental que faça o último trabalho da semana em sua categoria e jogue. O importante é que o garoto esteja jogando em alto nível, interessado, e não pense que está dando um passo para trás. Tanto não é assim que eu chamei o Brenner de lado e falei que estaríamos o observando lá, e que ele fizesse com ainda mais intensidade. Porque a maioria dos atletas quando desce se acha um pouco acima dos demais, só que esse é um caminho natural. De acordo com estudos, um atleta teria que ter 10 mil horas de trabalho para chegar bem ao profissional. Nem sempre isso acontece.

Você pode usar o Brenner ainda neste Campeonato Brasileiro?
Posso, ele tem capacidade. Tudo é questão de momento, da equipe dar uma sustentação para isso. Temos de ser muito cuidadosos porque nem todo jogador aproveita o primeiro momento de transição. De repente ele tem um crescimento naquele “start”, mantém um pouquinho, dá uma caída, pensa que tudo acabou e vai buscar forças para se recuperar. E volta bem, sem aquele ímpeto inicial que o fez ficar apenas por alguns jogos. Uns ficam três, outros cinco, outros dez, mas dão uma caída. E aí você tem de estar do lado.

Você confirmou que o Hernanes vai jogar contra o Botafogo. Na última segunda, disse que poderia usar dois meias quando ele estivesse no time. Isso diz respeito a Hernanes e Cueva? Você os vê como jogadores que se complementam ou têm a mesma posição?
Isso quem vai mostrar é o dia a dia. Eu tinha uma imagem do Hernanes, da saída dele daqui e de alguns jogos do Campeonato Italiano. Agora tenho que aguardar um pouquinho para ver como ele responde, é uma situação nova para nós. Vamos aguardar para ver se os encaixes acontecem. Eles são grandes jogadores e têm como se entenderem, independentemente do posicionamento.

Por que virou moda, de uns tempos para cá, as pessoas dizerem que tais jogadores não podem atuar juntos. No São Paulo, por exemplo, aconteceu com Ganso e Jadson.
Traz os dois de volta, então, depois a gente vê (risos). Às vezes, é o momento do jogador, a adaptação de um com o outro, deles com o time. Às vezes, não acontece, mas não quer dizer que não possam jogar juntos. Eu sou sincero, prefiro tirar um cara de marcação e colocar um que sabe jogar. Eles se encontram, se adaptam muito mais facilmente. Profissionais que sabem jogar é uma carência hoje, temos de ter mais deles.

Por falar no Cueva, é nítida a melhora dele nos últimos jogos. Ele parece, inclusive, mais interessado. Você conversou com ele sobre isso?
Tive uma conversa com o Cueva, e também com outros jogadores. É importante pontuar a cada um deles. Esse tipo de acomodação é complicado para o treinador administrar. Na minha concepção, o Rogério tinha uma ideia do que estava vendo do Cueva, do que ele já havia produzido, e você acredita que no jogo seguinte ele vai se recuperar. Isso acontece com todos nós. Se no primeiro instante você titubear com um jogador, vai ter que mudar a equipe em toda rodada e gerar um descontentamento inicial, uma insegurança logo em seguida. Por isso você acredita em determinados jogadores, pelo que eles já fizeram.

Por isso você acredita no Wellington Nem?
Até outro dia, todos os clubes queriam o Wellington Nem. O Bruno (lateral-direito), durante dois ou três anos, foi o melhor lateral das competições nacionais. Será que eles se esqueceram de jogar? Não é possível. Acontecem oscilações, o jogador dá uma caída, é normal. Mas temos de acreditar. Todos os clubes brigaram com o São Paulo pela contratação do Wellington Nem. Ele esqueceu de jogar futebol? Não. Alguma coisa está acontecendo, então temos que acreditar no profissional e tentar ir até o último momento com ele.

E ele tem características que você gosta em seus times, de velocidade, na ponta, certo?
Poucos jogadores no Brasil têm essa característica do um contra um, de buscar uma jogada final. Poucos têm esse perfil.

Você tem Nem, Marcinho, Denilson, agora o Marcos Guilherme. E o Maicosuel? Quando ele voltar também será nesse setor, ou mais por dentro?
Ele também. Nos últimos anos, ele fez muito mais por fora. Eu trabalhei com o Maicosuel no Cruzeiro e cheguei a usá-lo até como lateral-direito.

Há um conceito geral de que o São Paulo tem bons jogadores, mas não tem um bom time, em razão dessa remontagem do elenco. Com tempo, onde essa equipe pode chegar?
É muito difícil saber. Quando começou o Campeonato Brasileiro do ano passado, o Internacional era considerado um time que disputaria, senão o titulo, uma das vagas na Libertadores. O Inter tinha maus jogadores? Muito pelo contrário, tinha grandes jogadores e estava recebendo algumas contratações, era uma equipe promissora e liderou no início. Ninguém esperava o rebaixamento, e todo ano acontece com alguém. Todo ano vemos uma ou duas equipes grandes nessas condições.

O excesso de estrangeiros, e o fato de sempre ter que deixar um deles fora da lista de relacionados, é um problema para você perante o grupo?
Vivi esse problema no Palmeiras, eram oito estrangeiros e tínhamos que levar cinco. Eram 44 atletas no vestiário. Não é o ideal deixar um profissional fora de uma convocação em razão dessa impossibilidade. É muito difícil, sentimos isso no semblante de quem fica fora. Mas é uma situação que temos de enfrentar, se desenha dessa maneira nesse momento. Não há outro caminho.

Antes de você chegar, o contrato do Lugano foi renovado e ele foi considerado um jogador que atua até pouco, mas importante no ambiente. É isso que você percebe? Ele tem sido importante?
Ele tem se mostrado dessa forma, e tem sido uma pessoa importante para mim. Eu não conhecia o Lugano, a não ser de entrevistas e de vê-lo em campo, mas é um profissional que tem se mostrado muito sério, determinado, trabalhando por seu espaço e entendnendo a situação do clube. Eu o chamei para conversar sobre esse numero limitado de estrangeitos, mas é uma situação complicada. Não é fácil para ninguém.

Como você está no São Paulo? Feliz, surpreso, o que acha do clube?
Estou bem motivado, me sentindo muito bem. O São Paulo é um clube ao qual, como atleta, todos da minha época gostariam de ter chegado. O São Paulo sempre foi referência, não só nacionalmente, é um dos mais vitoriosos das últimas décadas. É um objetivo de qualquer profissional, em qualquer área. O São Paulo respeita muito seus profissionais, e deu para sentir no ambiente, com pessoas que limpam o CT ou estão dentro dos vestiários, em cargos mais humildes, que têm 30 anos ou mais de clube. Isso não acontece por acaso, é porque a casa te recebe bem.

Surpreendeu a postura da diretoria, de modo geral. Eu conhecia pouco o presidente Leco e o próprio Vinícius (Pinotti), nosso diretor de futebol, que está o dia todo aqui, se entrega pelo clube. Isso mostra uma identificação muito grande e cria um ambiente favorável de trabalho. Às vezes, não entendemos o momento que passamos, mas, de repente, pode ser aquele passo atrás que você dá para depois ter um salto ali na frente. A seriedade das pessoas que trabalham aqui dentro é muito grande, sinto essa entrega, por isso não entendemos o momento do clube. É difícil entender, pelas condições oferecidas e pela qualidade dos profissionais. Mas temos que enfrentar e passar da melhor forma possível para daqui a pouco buscarmos uma coisa melhor.

GE