Às vésperas da eleição para presidente, as dívidas contabilizadas pelo São Paulo em 2016 viraram munição para fogo cruzado entre alas políticas. A situação, que tem como candidato à reeleição o atual presidente, Carlos Augusto Barros e Silva, o Leco, segue um raciocínio próprio para afirmar que o endividamento foi reduzido na temporada passada. A oposição, liderada por José Eduardo Mesquita Pimenta, por outro lado, sustenta que as dívidas na verdade aumentaram. Aqui vamos nos debruçar sobre os números para responder duas perguntas-chave. Afinal, quanto deve o São Paulo e qual foi a evolução, positiva ou negativa, registrada em 2016?

Os números foram compilados por ÉPOCA, com o auxílio de um analista financeiro, com base no balanço financeiro do São Paulo – o documento ainda não é público, embora já tenha sido finalizado pelo clube e auditado por uma empresa independente, porque ainda não foi aprovado pelo Conselho Deliberativo. A diretoria financeira são-paulina não enviou a versão final do documento à reportagem, em respeito aos conselheiros, mas conferiu os dados, um por um, para assegurar que a avaliação fosse a mais clara e precisa possível.

A primeira resposta é direta: o São Paulo encerrou 2016 com R$ 285 milhões em dívidas. O critério para chegar a tal número, apesar de a contabilidade entre ativos e passivos parecer indecifrável para o leigo, é razovelmente simples. Consideramos apenas dívidas que vão demandar do clube pagamentos em dinheiro. Aquilo que, cedo ou tarde, vai afetar o caixa. São empréstimos com bancos e com pessoas físicas, compras de atletas cujas parcelas vão vencer, valores devidos a funcionários, sobretudo atletas, impostos renegociados com o governo federal e débitos com outros clubes e federações. De tudo o que se deve se subtrai só o que o clube tem em caixa. O critério não é nosso, mas do mercado financeiro, que o usa para avaliar empresas.

A segunda resposta, sobre a evolução na temporada passada, exige uma análise um pouco mais complexa. Sob o mesmo critério, o valor devido pelo São Paulo em 2015 era de R$ 270 milhões. Houve, portanto, um aumento de 5% no endividamento de um ano para o outro. Não é bom, mas há aspectos positivos. Um modo de analisar a gravidade é separar dívidas que vencem em curto prazo, dentro de um ano, das que levam mais do que isso, de longo prazo. A diretoria financeira reduziu o endividamento de curto prazo em 22% e elevou em 36% o de longo prazo. Isso significa que o clube não diminuiu a sua dívida, mas a esticou. É uma boa notícia para quem estava com a corda no pescoço porque tinha um monte de credores para pagar.

O perfil do endividamento também foi alterado pela gestão de Leco. O São Paulo devia R$ 130 milhões para bancos em 2015, uma dívida perigosa, com juros altos e pouca margem para renegociação. A dívida bancária caiu para R$ 88 milhões em 2016. Os empréstimos tomados com pessoas físicas, por outro lado, aumentaram de R$ 24 milhões no ano retrasado para R$ 33 milhões na temporada passada. Aí entra o dinheiro que Vinicius Pinotti, empresário e atual diretor de marketing são-paulino, emprestou do próprio bolso para que o clube fizesse investimentos – um caso menor, mas similar a Paulo Nobre, ex-presidente palmeirense que sanou as dívidas do time alviverde com empréstimos pessoais superiores a R$ 200 milhões.

A dívida tributária, aquela devida a governos, cresceu em 2016. Foi de R$ 85 milhões para R$ 93 milhões. Mas não quer dizer que impostos foram ignorados. O valor subiu porque há juros e encargos sobre o montante devido. Quando aderiu ao Profut, programa de refinanciamento das dívidas fiscais executado pelo governo de Dilma Rousseff, o São Paulo passou um pente-fino nos impostos que gestões anteriores deixaram de pagar. O clube parcelou os pagamentos em 240 vezes, 20 anos, mas vai ter de pagar juros toda temporada. Toda essa explicação é válida porque, na tentativa de avaliar se a gestão de Leco foi eficiente no trato com o endividamento, esse era um item que não tinha outra solução. Não havia como fugir dos juros.

Os dirigentes da situação, aliados de Leco, usam um raciocínio otimista para resumir as dívidas são-paulinas. Adílson Alves Martins, atual diretor financeiro tricolor, considera o número de R$ 144 milhões. A lógica é a seguinte. Só três dívidas são tidas como preocupantes pelo cartola: empréstimos bancários, empréstimos de terceiros e compras de jogadores cujas parcelas atrasaram. A soma desses três itens em março de 2017 dá R$ 144 milhões. As demais dívidas ou foram alongadas, como o Profut, ou virão junto com receitas. Alves Martins explica que o dinheiro recebido pelo São Paulo com a Timemania, uma loteria federal, é suficiente para pagar as parcelas das dívidas fiscais renegociadas via Timemania. São dívidas equacionadas. ÉPOCA, porém, ainda as considera como dívidas.

As vendas de alguns jogadores no início da temporada de 2017 também ajudaram a pagar mais dívidas, segundo o cartola. David Neres saiu por R$ 50,7 milhões para o Ajax, da Holanda, em janeiro. Parte do dinheiro foi reinvestida na compra dos direitos econômicos de Lucas Pratto, parte foi usada para quitar dívidas. O zagueiro Lyanco também acaba de se acertar com a Torino num negócio que renderá cerca de R$ 20 milhões ao São Paulo. São fatos que amenizam uma situação financeira ainda crítica. O clube calculou em seu orçamento para 2017 que precisará de R$ 67 milhões em vendas de atletas para não terminar o ano no vermelho. Se isso acontecer, as dívidas voltam a aumentar, e o problema continua.

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