O ano de 2015 está acabando e junto com ele, grandes símbolos do que significa ser são paulino se despedem do clube. A “Era Cenistica” chega ao fim de sua vitoriosa trajetória, Luis Fabiano nos deixa após se tornar o terceiro maior artilheiro de nossa história e, infelizmente, Juvenal Juvêncio, figura marcante do “folclore” tricolor e responsável por glórias e fracassos, faleceu.

Mas hoje não quero falar do tempo presente, muito pelo contrário. Hoje quero falar das origens do clube, quero falar das ideias que construíram o São Paulo, pois para superarmos o momento ruim de 2015, precisamos aprender com nossa própria história.

Vamos começar pela ideia que deu origem ao São Paulo:  O ano era 1900, e o futebol florescia na capital paulista e no brasil como um todo. Charles Miller trouxera o futebol na bagagem e ensinava aos paulistanos, que começavam a criar gosto pelo esporte e dando origem aos primeiros clubes, como o São Paulo Railway de Miller e outros imigrantes ingleses, o time do Colégio Mackenzie (também de ingleses), o Internacional de SP e o Germânia (atual Pinheiros).

Ainda que a popularidade do esporte crescesse entre os brasileiros, todo os clubes formados na capital eram compostos por estrangeiros, principalmente ingleses e alemães. A verdade é que o futebol paulista carecia de um clube verdadeiramente brasileiro. E foi assim que nasceu o Club Athletico Paulistano.

“ Mas nós não estávamos falando do São Paulo? ” Sim, e continuamos falando. A verdade é que a história do nascimento do São Paulo foi, até certo ponto, simplificada demais. Engana-se quem pensa que “ O São Paulo surgiu da fusão do Paulistano com a Atlética das Palmeiras”, pois a história é muito mais rica e cheia de significados que isso.

Para explicar o que quero dizer, vamos avançar até 1930. O Paulistano já era o maior campeão paulista (11 títulos) e o maior time de futebol a sua época, com feitos inigualáveis como o tetracampeonato consecutivo, o primeiro título nacional do país (A Copa dos campeões de 1920) e a lendária excursão à Europa que rendeu o apelido de “ Reis do Futebol”. Fato é que o Paulistano sempre foi um expoente do futebol paulista: Tanto que o clube foi o responsável direto pelas crises políticas do início do futebol em São Paulo, afinal, seria o Paulistano o responsável pelo racha da federação no começo dos 1910, que levou a criação da APEA, e novamente seria responsável pelo segundo racha de federações, onde fundou a LAF em defesa do amadorismo no futebol.

Tantas brigas políticas desiludiram os dirigentes do Paulistano. O Clube, fundado para ser um time de futebol brasileiro, via o futebol se tornar cada vez mais uma briga extracampo do que um esporte, ainda mais com a crescente profissionalização do esporte, que para os membros do CAP era inaceitável: O futebol se jogava por paixão, não por dinheiro.

1929 foi a gota d’agua para o Alvirrubro: Após o enfraquecimento da LAF, os dirigentes do clube anunciam o fim do futebol no Paulistano. Um pecado! Como que um clube que nascera para ser o representante dos brasileiros no futebol fecharia, justamente, seu departamento de futebol? Era inaceitável.

Dirigentes, jogadores, torcedores, muitos não aceitavam isso. O futebol do Paulistano não iria morrer, independente do que o presidente do alvirrubro dissesse, e é dessa perseverança que nasce a ideia de formar um novo clube, novamente voltado somente para o futebol, que carregasse as tradições do CAP.

Não é à toa que nos chamamos São Paulo, afinal, éramos o futebol do Paulistano que ganhava vida própria, pois o alvirrubro continuava existindo (e existe até hoje). Não é à toa também que somos “ Futebol Clube” (escrito a maneira brasileira, sem estrangeirismo, pois somos um clube dos brasileiros), pois esta é a mensagem que eles queriam passar: São Paulo Futebol Clube, ou, o Futebol do Paulistano que ganhou vida própria.

Interessante é notar que o nome já estava decidido antes mesmo das cores do novo clube ou de como esse clube surgiria. Os que visitavam a SPFCpedia devem ter visto os posts sobre a origem do clube, e para mim o mais interessante deles era o projeto inicial do São Paulo: os remanescentes do Paulistano negociavam com a Atlética das Palmeiras e com o São Bento a criação de um novo clube, de nome já decidido, o São Paulo FC.

A proposta era megalomaníaca até certo ponto: Palmeiras e São Bento eram vizinhos de estádio, uma vez que a Chácara da Floresta ficava ao lado do campo do São Bento. A ideia era demolir tudo e no lugar construir um grandioso estádio, que seria a casa do São Paulo, que inclusive seria tetracolor: Branco, comum a todos, Vermelho do Paulistano, Preto da Atlética e Azul do São Bento.

Até dezembro de 1929, seria assim que o São Paulo nasceria, até que de última hora o São Bento desistiu, mas o projeto seguiu em frente da forma que conhecemos: em 25 de janeiro, aniversário da cidade, nasce o SPFC, desta vez tricolor e, por incrível que pareça, as cores do clube e do estado serem a mesma foi uma coincidência do destino. Desta forma também a Chácara da floresta se tornou a primeira casa do São Paulo.

O Título paulista em 1931, a conquista mais importante da nossa história, consolidou todo esse movimento: após 1931, éramos de fato o São Paulo, não mais o Paulistano renomeado. A conquista também serviu para consolidar o São Paulo com sua torcida, que já era enorme, pois era a mesma que por décadas acompanhou o CAP. Mas agora, não eram mais alvirrubros, eram tricolores.

Na verdade, a história do São Paulo só pode ser entendida de fato se levarmos em conta que somos o futebol do paulistano que tomou vida própria. Como se explicaria que um clube recém-nascido já possuía uma das maiores torcidas da cidade? A resposta é que não éramos recém-nascidos, éramos renascidos.

Podemos olhar para 1935 também, onde essa ideia fica ainda mais clara: Após novas brigas políticas, os dirigentes do SPFC decidem tomar o mesmo caminho daqueles do paulistano alguns anos antes e fechar as portas do clube. E novamente, a reação da torcida e do restante dos dirigentes foi de aversão total: O palácio do Trocadero, que foi usado como motivo para se fechar o clube, foi apedrejado pela torcida (novamente, que clube de 5 anos de idade possuiria uma torcida tão grande a apaixonada a esse ponto?).

A primeira reação surgiria em julho daquele ano, quando Porphirio da Paz e a família Mecca, junto a outros sócios do São Paulo, tomam a primeira medida para refundar o clube, criando o então Clube Atlético São Paulo. Sim, escolheram a mesma alcunha que acompanhava o Paulistano, afinal, por que não resgatar ainda mais a ideia de que éramos o mesmo time? Mais tarde, em dezembro, o estatuto do Clube Atlético São Paulo ( que nunca entrou em campo) seria a base pra refundação do SPFC, agora de uma vez por todas.

E o que o passado pode ensinar para os dirigentes de hoje? Várias coisas: A primeira, é que somos um clube de Futebol, e não um antro de corrupção e comissões. A segunda, é que sempre nos reerguemos e voltamos ainda mais fortes. A terceira, é que não temos medo de encarar os problemas e nos livrarmos daqueles que agem contra o clube. Mas a quarta coisa, e mais importante: Amamos nosso clube incondicionalmente. O São Paulo nasceu da paixão de sua torcida, que não suportaria ver seu time morrer. O São Paulo renasceu da paixão de sua torcida em 35. E o São Paulo continuará trilhando o caminho do sucesso enquanto tivermos pessoas apaixonadas pela instituição no comando, e não homens de pouca fé como os malditos que nos enfiaram em situações adversas durante nossos 115 anos de história. Aprendam com Porphirio da Paz!!!

 

Curiosidades

. São Paulo e Paulistano, somados, tem o maior número de títulos paulistas: 33 títulos.

. Se somássemos a artilharia, Friedenreich se tornaria o maior artilheiro da “causa”: 391 gols, sendo 289 pelo Paulistano e 102 pelo SPFC.

. Em 2000, o São Paulo homenageou o Paulistano pelos 100 anos da instituição. Tal homenagem nunca foi feita a Atlética das Palmeiras.

 

Lucas Adams