É importantíssimo não esquecer e ter bem vivo em nossas mentes o passado e o que a trupe que assumiu fez antes do decepcionante, pífio e vergonhoso mandato da gestão Aidar. Veja matéria impecável de Emerson Gonçalves sobre como o São Paulo foi jogado ao momento que está:

O pesado custo para o São Paulo do terceiro mandato de Juvenal Juvêncio

À guisa de Introdução

Juvenal Juvêncio em mais de uma entrevista disse:

“Precisamos vender pelo menos um jogador por ano para fechar as contas”.

Seu antecessor, Marcelo Portugal Gouvêa, também sabia disso muito bem, muitíssimo bem, e dizia a mesma coisa. MPG, porém, tinha uma visão diferente sobre o futebol e sobre o São Paulo, que incluía fortalecer o clube, estruturalmente, diversificando e aumentando as receitas, de forma a fugir da maldição da necessidade de “vender jogador”. Foi essa visão que levou-o a reestruturar o São Paulo e criar Unidades de Negócios, que deveriam ser capazes de se sustentar. Os balanços anuais no decorrer de sua gestão podem ser vistos como aulas práticas de planejamento, administração e realização.

(Nesse post falarei sempre em terceiro mandato de Juvenal Juvêncio, mas, tecnicamente, foi seu quarto mandato, pois ele foi presidente de 1988 a 1990; fica mais simples, porém, falar em terceiro por ter sido o terceiro consecutivo, em desacordo claro, flagrante, com o Estatuto do clube.)

Nos dois primeiros anos de sua gestão, Juvêncio seguiu o que já vinha sendo realizado. Recebeu um clube bem estruturado e saneado financeiramente, Campeão Mundial de Clubes. Antes de completar um ano à frente do clube, sagrou-se Campeão Brasileiro, fato que viria a repetir-se por mais dois anos.

No final de 2008, a poucos dias do São Paulo conquistar o Tricampeonato inédito e sonhado, Marcelo Portugal Gouvêa faleceu, no que veio a ser uma perda muito sentida. Talvez por coincidência, mas eu acredito que não, já em 2009 o São Paulo destrambelhou e começou um período de descontrole de gastos.

É provável, penso que é certo, que Juvêncio gastou gastou gastou acreditando em vendas miraculosas, em “vender” um Breno por ano, pelo menos, além de outras transferências menos badaladas e de valores menores. Vendas que cobririam suas despesas sem controle, sem limite, sem nexo, sem planejamento, ao contrário do que ocorreu entre 2003 e 2006. Já em 2007 o clube teve uma amostra em escala reduzida do que seria o futuro, com a contratação, por exemplo, do zagueiro Juninho, negócio nascido e concretizado na cabeça de Juvêncio e, como dizem pessoas próximas, Milton Cruz. Por sinal, a dupla Juvêncio/Cruz brincou de gastar dinheiro por alguns anos, numa verdadeira festa. Neste OCE, posts e posts relatam o desenrolar desse processo.

“Vender” jogador é atividade incerta, é atividade de risco. Quando não existem controle e inteligência na condução dos negócios, os “gestores” passam a torcer por vendas mirabolantes e miraculosas, como foi a de Lucas para o Paris Saint-Germain. Dos 115 milhões de reais do negócio, o São Paulo ficou com R$ 85 milhões. Desse dinheiro, pelo menos R$ 66 milhões foram gastos na amortização de dívidas. A maior transação do futebol brasileiro deixou no São Paulo apenas histórias.

Essa é uma receita que escapa a qualquer planejamento, é uma receita não recorrente ou não operacional. Por esse motivo, desde seu início este OCE bate na tecla que o que vale e deve ser enfatizado é o conjunto de receitas operacionais, ou seja, as receitas recorrentes geradas pelo negócio Futebol: direitos de transmissão, receitas de marketing, bilheteria, sócio-torcedor e as receitas do estádio e licenciamento de produtos.

Esse trabalho que começa mais abaixo, elaborado por um conceituado profissional da área contábil e financeira, tem como base única e exclusiva os balanços do São Paulo FC. Balanços são documentos oficiais, o que neles está escrito é “lei”, é a verdade, e para isso são assinados, têm responsáveis legais e, ainda por cima, são auditados por empresas independentes. O que os balanços mostram é a realidade nua e crua, sem firulas e sem enfeites.

São os balanços que vão nos mostrar, de forma condensada, o quanto custou o terceiro e ilegítimo mandato de Juvenal Juvêncio à frente do São Paulo.

Esse post é, igualmente, a comprovação cabal e irrefutável da importância das gestões. Os clubes são o que são suas gestões. Essa derrocada do São Paulo pode ser colocada em aulas de gestão esportiva como o exemplo perfeito do que não fazer.

Voltando ao futebol, de onde nunca saímos… Dias atrás, numa conversa pessoal por rede social, Raul Correa da Silva, que foi o diretor-financeiro do Corinthians na fase de recuperação e reestruturacão do clube, até o ano passado, escreveu uma frase que sintetiza muito do que eu falo e escrevo: “O gol é consequência da gestão.”

E é mesmo.

O Efeito do 3º Mandato de Juvenal Juvêncio

Comportamento das Receitas

O ano de 2010 foi o último completo da gestão original de Juvenal Juvêncio. Entre 2011 e 2013 o clube atuou sob seu 3º e contestado mandato, até que em abril de 2014 assumiu o que hoje já é um ex-presidente: Carlos Miguel Aidar.

(Esse mandato, de abril de 2011 a abril de 2014, foi contestado judicialmente por ferir frontalmente o Estatuto do clube; mesmo assim, por tecnicalidades levantadas por, ora vejam, Carlos Miguel Aidar, a justiça acabou permitindo o mandato; vale dizer que a decisão judicial saiu pouco tempo antes do final do mandato. EG)

Considerando-se apenas as Receitas Recorrentes, que excluem as receitas com negociações de Direitos Econômicos, o grande destaque e que faz com que as Receitas cresçam são os Direitos de Transmissão. Em 2010 eles representavam 30% das Receitas Recorrentes. Teve um salto expressivo em 2012 para 47%, mas manteve-se perto de 34% nos anos regulares. A explicação é que em 2012 houve um salto pelo recebimento das luvas pagas pelo novo contrato do Brasileirão.

Esta, porém, não é uma Receita que se movimentou e cresceu pela gestão de Juvenal Juvêncio. Com ou sem ele, esta é uma Receita que se move de forma independente, reflete um contrato individual, mas com característica coletiva. A capacidade de gestão ou os resultados de gestão de Juvenal Juvêncio se dá nas outras Receitas, que como vemos no gráfico e detalharemos a seguir, pouco se movimentaram.

Podemos ver nas tabelas acima que as movimentações das Receitas Recorrentes, sem os Direitos de Transmissão, têm comportamento bastante errático quando vistas de forma agrupadas.

Ao mesmo tempo em que evoluíram 15% em 2011 e 2013, fruto do crescimento das receitas com Publicidade, em 2012 e 2014 caíram 6%, ancoradas também pelas receitas de Publicidade. Ou seja, isto indica claramente que a gestão Juvêncio foi incapaz de vender de forma consistente a marca SPFC. Neste período o clube teve como patrocinadores másters o BMG e a Semp Toshiba, mas passou muito tempo com patrocínios pontuais ou mesmo sem esta receita.

Além disso, observamos a queda recorrente e constante das Receitas com o Estádio do Morumbi, o que denota a incapacidade de gerir de forma produtiva seu maior ativo.

Na prática, nas Receitas em que a gestão pode interferir mais profundamente, o terceiro mandato de Juvenal Juvêncio foi um fiasco

Fluxo de Caixa

O Resultado Operacional Recorrente vem da soma entre todas as Receitas e todas as Despesas. Significa, em outras palavras, quanto o clube teve de resultado – lucro ou prejuízo – dentro da sua atividade.

(Nos posts sobre os clubes, empregamos os termos Superávit e Déficit, em lugar de lucro ou prejuízo; esses dois estão relacionados a empresas, ao passo que os dois primeiros são mais empregados para entidades sem fins lucrativos, como os clubes de futebol; nesse texto, optei por preservar a grafia original, de resto mais compreensível pelos leitores pouco acostumados aos termos contábeis. EG)

Uma gestão equilibrada buscaria investir no máximo uma porção deste valor, pois dele ainda precisam ser pagas outras Despesas, incluindo eventuais Juros, além de Dívidas de todos os tipos.

No gráfico abaixo, tanto a linha como as colunas estão na mesma escala, o que significa dizer que o clube, numa gestão racional, deveria investir apenas até limite da linha, pois o que faz acima desta tem que buscar recursos em outros lugares, como Adiantamentos ou Dívida Bancária.

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Trazendo estas definições para o dia-a-dia do SPFC, significa que tanto no último ano da gestão real como nos anos do terceiro mandato, Juvêncio investiu muito acima da capacidade financeira do clube, e como veremos a seguir, teve que buscar recursos em outras fontes.

Esse comportamento no terceiro mandato foi semelhante ao final do segudo e foi repetido por Carlos Miguel Aidar logo que assumiu – e em parte pelo próprio Juvenal Juvêncio entre Janeiro e Abril de 2014, antes de passar o cargo – com o agravante de que em 2013 e 2014 o Resultado Operacional foi negativo.

(No final desse terceiro mandato, o São Paulo pediu e a Globo concordou com uma antecipação de direitos de transmissão; uma foto festiva, por sinal, ilustrou o noticiário, com Juvêncio e Aidar sorridentes; o adiantamento, segundo Juvêncio, era para que Aidar assumisse com dinheiro em caixa, mas dos R$ 50 milhões que foram tomados, nada menos de R$ 40 milhões foram gastos antes da posse do novo presidente, que assumiu com caixa baixíssimo e, de cara, contratou Alan Kardec, gastando o que não podia e gerando um sério atrito com a Sociedade Esportiva Palmeiras; é importante dizer, novamente, que Carlos Miguel Aidar sabia muito bem qual era a situação de caixa e a situação geral do São Paulo ao assumir, ao contrário do que depois veio a falar. EG)

Traduzindo: péssima gestão.

A Dívida

O clube, naturalmente, foi buscar recursos para fechar as contas junto aos bancos. Veja no primeiro gráfico abaixo o comportamento da Dívida Bancária. Cresce na mesma proporção da diferença entre Resultado Operacional e Investimento.

Em 2013, com a venda de Lucas, o Resultado Operacional foi muito superior ao Investimento e as sobras foram utilizadas para pagar Dívida. Mas em 2014, com desempenho pífio, as Dividas voltaram aos patamares de 2012. Ou seja, a venda de Lucas foi em vão.

O segundo gráfico corrobora isto, quando comparamos o Fluxo de Caixa Livre, que é o quanto sobra para o clube pagar suas Dívidas – aqui em versões Recorrente e Total – e o comportamento da Dívida bancária. Notem que na versão Recorrente não há sobras, que vieram exatamente da venda de Lucas.

Resumindo

Os 3 anos do terceiro mandato de Juvenal Juvêncio não justificam o que muitos chamaram de “mal necessário”.

Primeiro porque sua ação na direção de levar o Morumbi à Copa do Mundo foi um fiasco total, dado sua inabilidade de relacionamentos.

Depois, sob o ponto-de-vista de Receitas não trouxe nada de relevante e apenas fez o clube andar de lado, sendo incapaz de vender de forma consistente e relevante a marca São Paulo FC.

Além disso, os Custos mantiveram-se elevados, tanto que as Despesas Operacionais do último ano e de 2014 foram maiores que as Receitas, mostrando o descontrole deste item.

Por fim, o elevado volume de investimentos foi incapaz de trazer retorno, tanto que a Dívida cresceu absurda e consistentemente, e nem a venda da maior revelação do clube dos últimos 10 anos foi suficiente para solucionar o problema.

Ou seja, o terceiro mandato de Juvenal Juvêncio foi apenas um mal, necessário apenas para que os rivais crescessem no período.

Comentário do OCE

Por ocasião da campanha para seu terceiro mandato, Juvenal Juvêncio disse mais de uma vez, disse várias vezes aos mais diferentes interlocutores e veículos de informação, que não havia ninguém capacitado a substitui-lo no São Paulo. Disse mais: que ele era essencial para levar à frente o planejamento, manter o time vencedor e garantir a Copa do Mundo no Morumbi.

Bem, estamos vendo, ou o Tempo, segundo Juvêncio o “Senhor da Razão”, está mostrando que nada disso ocorreu.

Por que o São Paulo? Por que esse post e outros?

Perseguição?

Nada disso, muito longe disso.

O que aconteceu com o São Paulo, e continua acontecendo, é – e vou repetir – um exemplo perfeito de ótimas gestões e de péssimas gestões.

Basta pegar os balanços do clube entre, por exemplo, 2000 e 2015, e uma análise, a exemplo dessa que está mais acima, vai mostrar a gangorra gestora.

Uma hora no alto…

Outra hora lá embaixo…

Não por conta de “ciclos” soberanos – ops… vou mudar isso – então, não por conta de ciclos naturais e absolutos, muito pelo contrário.

Existem ciclos em um time de futebol, mas ciclos definidos, por exemplo, com a presença de um grande meio-campista que por si só determina uma forma de jogar. Ou ciclos definidos por uma grande geração.

Ciclos de gestão, porém, não existem. E compete às gestões administrar o final de um ciclo em um time e leva-lo a outro.

Como fez, por exemplo, o Barcelona. Ronaldinho, Deco, Eto’o e outros saíram ou pararam. Vieram Messi, Neymar, e o time continua vencedor. Rickjaard saiu, veio Guardiola.

Nas mudanças de formação, nas grandes mudanças de elenco, é natural um período menos vitorioso, mas nada que se compare ao que vemos no Brasil, com grandes clubes sendo rebaixados ou jogando para se manter na primeira divisão. Vemos, também, grandes investimentos, mas administrados, feitos racionalmente, dentro das possibilidades do clube.

Tudo isso não significa ciclo.

É, apenas e tão somente, má ou péssima gestão.

Nada mais que isso.

Emerson Gonçalves