Um dos motivos pelo qual o jornalismo esportivo impresso sofre muito e precisa lutar para sobreviver é a mudança na rotina de cobertura de clubes. Hoje, os repórteres tem inúmeras restrições – contra as quais jamais lutaram – só podem ouvir quem as assessorias deixam e se acomodam com isso, dando 24 horas depois as mesmas informações que as TVs passaram a véspera inteira exibindo.

No meu tempo de repórter era diferente. Conversávamos com quem queríamos. Comissões técnicas e jogadores aprendiam quem eram os bons profissionais. Os jornalistas eram próximos do grupo, e podiam selecionar informações, contextualizá-las. Um técnico podia confidenciar algo a um repórter de quem gostasse – ou que tivesse capacidade de extrair a informação exclusiva – e o jornalista bancava a informação, sem precisar revelar a fonte. Se a fonte desmentisse, já sabíamos que não era confiável, nem honesto. Mas isso raramente ocorria.

Exemplo: um setorista do São Paulo podia se chegar a Juan Carlos Osório, que lhe diria que não confia na diretoria tricolor. O jornalista escreveria – ou falaria – que Osório não confia na diretoria, mas o técnico não precisa se expor, a informação era de responsabilidade do jornalista.

Mas, surpreendentemente, neste marasmo de coletivas repetitivas e de profissionais com medo de se comprometer – claro, cada coisa que falam será reproduzida por TODAS as emissoras de rádio e TV e por TODOS os jornais -, Juan Carlos Osório diz o que pensa, ou seja, diz a verdade em coletivas. Atos de coragem, atos que arejam o futebol, que mostram aos mais jovens que a verdade sempre faz bem.

A declaração de Osório, reclamando que foi enganado pelas promessas da confusa diretoria do São Paulo, deveria, é claro, ter repercussão. Mas não deveria causar o espanto que causou na imprensa. Causou porque a ala mais jovem da nossa imprensa nunca havia tido contato com tamanha sinceridade. Voltei no tempo e me emocionei quando ouvi Osório esfregar na cara do jovem repórter: “você acha mesmo que se eu perder quatro jogos eu vou continuar?” Isso era coisa que eu ouviria numa resenha particular com um treinador já de banho tomado, preparando-se pra deixar o clube, duas ou três horas após o fim do trabalho no campo.

Se o futebol e o jornalismo esportivo fossem bons como foram um dia, não seria apenas com Osório que teríamos sinceridade, que teríamos verdades, que teríamos uma informação mais variada e de melhor qualidade. Isso acontecia em todos os clubes. Não era preciso ficar vendo burocraticamente técnicos enrolando e dizendo que “time grande não pode priorizar isso ou aquilo, vamos com tudo no Brasileiro e na Copa do Brasil”. Osório diria aos bons repórteres ontem, e diz a todos hoje: “A prioridade é a Copa do Brasil. A prioridade é um título, e não temos condições de ganhar o Brasileiro”.

Não dá para culpar técnicos e jogadores por não quererem ficar na reta numa coletiva. Mas dá para exaltar Osório. Nem vou entrar na parte técnica, onde, quando ele sair – tomara que não seja quinta-feira – deixará como legado a marcação de escanteio com apenas quatro homens, o rodízio de jogadores, o incentivo a que jogadores atuem em mais de uma posição, a recuperação de Alexandre Pato, a transformação de Breno em um bom volante, de Thiago Mendes em um dínamo puxador de contra-ataques (mesmo sendo um volante)… Errou, e vai errar mais, porque é humano. Insistiu com Carlinhos na ponta direita e entregou três pontos ao Flamengo. Mas tem muito saldo.

Quando Osorio chegou ao Morumbi, por alguma intuição eu fui muito com a cara dele. Depois do que ele tem feito pelo São Paulo, pelo futebol e pelo bom jornalismo, sem medo de ser transparente e honesto com todos, eu vou com a cara e o coração dele.

Ricardo Gonzalez, GE