Foi uma digna recepção a Don Osorio, o novo técnico tricolor, que, por sua vez, soube, com as palavras, esboçar uma boa perspectiva sobre seu trabalho futuro, embora duvide que tenha tempo disponível, neste calendário estúpido, de colocar em prática suas ideias.

Pelo menos, numa das respostas, revelou que sabe o abecê do futebol, o que não posso dizer da imensa maioria dos nossos treinadores, medalhões e iniciantes, com os quais fiz sempre esta pegadinha: o que é o quadrado mágico? Todos, sem exceção, deram a mesma resposta: são quatro jogadores de alta classe jogando juntos lá na frente.

Nem passaram perto, pois quadrado mágico foi um termo garimpado da matemática e da geometria pelo escocês Herbert Chapman, o inventor do WM, base de todos os sistemas modernos, para identificar a formação dos quatro homens de meio de campo. Mágico, porque os dois médios apoiadores (volantes, se preferirem) e os dois meias formam um quadrado, que, de acordo com suas respectivas movimentações, pode se transformar em losango, triângulo ou retângulo.

Osorio, pelo menos, sabe isso ao citar corretamente essa formação eventual de meio de campo, dentre as várias fórmulas que poderá utilizar na escalação de seu novo time. Sempre, segundo ele, de acordo com a formação do adversário seguinte.

Outra declaração importante: defender fica mais fácil se privilegiarmos o ataque. Isso sugere uma marcação alta, a partir do campo adversário, onde se começa a defender com os atacantes.

Por fim, acenou com a possibilidade de o São Paulo passar a atuar com um volante apenas, dois meias e três atacantes, nada mais moderno quanto eterno.

Resta, agora, torcida, mídia e diretoria armazenarem um generoso estoque de paciência, à espera de que seu trabalho consiga se inserir entre tantos jogos e viagens que nosso calendário impõe aos clubes brasileiros, impedindo os treinadores operarem no tempo devido.

Alberto Helena Jr

Gênio ou ‘Professor Pardal’: sem meio termo, só os resultados podem sustentar Osorio no São Paulo

O Brasil não é o país do futebol, talvez nunca tenha sido. Aqui o culto não é ao jogo, mas à vitória, celebrando a do time de coração e gozando a derrota dos rivais. Com a seleção, a relação é de cobrança, exigência de título mundial para a maior vencedora com cinco taças.

Sim, em qualquer lugar do planeta com bola rolando o objetivo principal é vencer. Nos Estados Unidos é até cultural segregar o mundo entre vencedores e fracassados, mas também avaliando desempenho. No futebol brasileiro, porém, o único critério de avaliação é o resultado.

Se o que vale é ganhar, natural que se recorra ao que deu certo antes e resista ao novo. Por isso persiste nestas terras velhos conceitos como “técnico bom é o que não atrapalha”, “tática é dispensável quando há talento”, “volante marca”, “meia cria”, “centroavante faz gol”.

O que conta são os três pontos. Duas vitórias jogando mal significam “boa fase”. Um empate e uma derrota dominando os jogos decretam: “crise”. Por isso o perde-ganha, a inconstância, o rodízio de técnicos.

É este cenário que recebe Juan Carlos Osorio, treinador colombiano que assume o São Paulo. Estudioso, pós-graduado em Ciência do Futebol em Liverpool. Metódico, profissional que investe na pedagogia de professor para trabalhar com seus atletas. Influenciado por Alex Ferguson na montagem de uma estrutura tática. Também por Marcelo Bielsa ao adaptar sua equipe às características do adversário.

Por isso no Atlético Nacional de Meddelín não costumava repetir escalações, variava o desenho tático, aproveitava jovens da base e alterava a função do jogador de acordo com a necessidade. No país em que a grande maioria, especialmente as estrelas, não convive bem com o banco de reservas, a paciência com garotos é curtíssima e há uma enorme dificuldade para diferenciar posições e funções dentro de um debate tático ainda muito pobre é um enorme desafio. O maior de sua carreira, como o próprio admitiu.

Osorio trabalha com conceitos. Quando escala três ou quatro na retaguarda, o objetivo é ter vantagem numérica atrás. Se opta por um meio-campista de bom passe à frente da defesa, a meta é controlar a posse de bola e qualificar a saída para o ataque. Dois jogadores abertos – ponteiros, meias ou alas – significam amplitude e profundidade. Quando diz na primeira coletiva que Pato e Ganso serão os primeiros marcadores, a ideia é pressionar a saída do adversário e aproximar os setores.

Como Osorio vai armar o São Paulo? Incógnita. Propor uma formação e um sistema seria puro exercício de adivinhação. E é bom que seja assim em um clube que precisa mesmo de disputa interna para voltar a competir forte. Quando o novo técnico diz “todos são importantes”, o recado é claro: o tricolor paulista vai jogar futebol coletivo, que aproveite o melhor de seus talentos individuais em benefício da equipe. A primeira impressão é ótima e a expectativa, até torcida, é que dê certo.

Nada disso foi debatido por enquanto. O que chamou atenção até agora foi o periférico, o menos importante: os bilhetes para os jogadores, as canetas azul e vermelha nas meias. Pouca ou nenhuma preocupação com o conteúdo dos recados aos seus comandados. Em coletiva, Michel Bastos já disse que não se importa com o rodízio no elenco, contanto que ele seja sempre o titular. E riu. Brincadeira com fundo de verdade.

Tudo será analisado pela maioria da torcida, dos dirigentes e dos jornalistas pelos resultados. Imediatos. Mais ainda em um dos clubes mais vencedores do país que vive seca de títulos. Com a desconfiança tradicional em relação aos técnicos estrangeiros e a torcida contra de boa parte seus colegas brasileiros, sempre dispostos a garantir reserva de mercado.

Realidade nua e crua: se começar ganhando vira gênio e todas as peculiaridades serão celebradas como “segredos do sucesso”. Duas derrotas seguidas e o rótulo de “gringo Professor Pardal” passa a seguir o colombiano. Até mesmo entre os diretores tricolores que hoje pedem paciência com o novo técnico.

Por aqui é assim. Sem meio termo. Boa sorte ao Osorio. Vai precisar.

André Rocha