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Deceptio Sao Paulo hodie tuum (Decepção com o que é, hoje, o São Paulo)

Não há nada na riquíssima lïngua Portuguesa capaz de exprimir com perfeição o que eu sinto, o que eu tenho sentido, na verdade, com este São Paulo. Então me lembrei do Latim,  língua indo-europeia (do ramo ocidental dessa família), falada pelos habitantes do Lácio e pelos antigos romanos, documentada desde o século VII a.C.

E porquê? Porque o Latim, apesar de belíssimo (eu acho!) hoje carrega consigo o rótulo de língua morta, ninguém mais se comunica por ela, exceto um número bem restrito de pessoas ou organizações, geralmente religiosas. Não, não quero decretar a morte do São Paulo. Mas, de certo modo, algo está dormente (espero que não morto!) em mim em relação ao tricolor. Com sinceridade, confesso que é algo que tem me preocupado, mais ainda do que o São Paulo da atualidade.

Imagino que deva estar ocorrendo com outros torcedores e tenho receio do que essa onda de “desdém” pode ocasionar.

Depois de tantas expectativas, as mais duras decepções. Duríssimas, aliás. E para todos nós, imagino. Ocorre que tenho me sentido diferente. De repente, me corre pelas ventas um certo desdém, um certo sentimento de “tanto faz”. Estou realmente preocupado. Assisti aos últimos jogos, depois de nossa mais recente eliminação (e já foram tantas!), e não consegui vibrar, não me vi torcendo, ao menos não com a mesma intensidade. Em certos momentos, me peguei cochilando — COCHILANDO! — no meio das partidas. Estou preocupado de verdade! E procurando um remédio milagroso que me traga de volta, ainda que paulatinamente, em doses homeopáticas, aquela vontade desenfreada de ver o São Paulo em campo.

Talvez seja fastio. Mas um fastio diferente. Fastio está relacionado ao empanturramento. É isso, só que uma espécie de empanturramento de nada. Sabem como é? Por mais paradoxal que pareça, sinto uma espécie de fastio de passar tanta fome, um certo cansaço disso, pela situação do clube como um todo, nos últimos longos anos.

Principalmente por ver o tricolor se tornar uma horrenda compilação de tudo aquilo que criticamos, de tudo aquilo que esconjuramos, para dizer a verdade. Está institucionalizada a ode ao remanso, ao “não fazer”. Brilha um compêndio de omissões que dói. Pode ser que minha visão, afetada pelas minhas condições atuais como torcedor, esteja turva, mas o que vejo é um compêndio dantesco capaz de impedir qualquer movimento, por parte do São Paulo, de alterar a rota tenebrosa que escolheu.

E por isso, também em Latim, a brincadeira de sempre, o termo “Opinião Leviana”, ou “Considerandam Leviter”, apropriadamente. Separei quatro tópicos e prometo ser objetivo.

A eliminação

Faltou coragem. Toda hora falta alguma coisa, geralmente, mais de uma. Se sobrou brio nos últimos jogos antes do confronto em Minas, no Mineirão o brio deu lugar ao medo. E o medo também produz coisas inacreditáveis, como fazer elefantes correrem de formigas. Figura de linguagem e licença poética à parte, em suma: fomos covardes! Porque, na minha concepção, vence quem joga. O Cruzeiro jogou. No seu pior momento no Morumbi, o time azul foi melhor que o tricolor foi em seu melhor momento no Mineirão. Evidente, pois, a condição do atual comandante, Milton Cruz, frente ao time. Não é a sua, não está preparado para tal, não tem estofo para a função. A escalação, a concepção de jogo, a estratégia, a tática, as alterações… Foram erros demais para os noventa minutos. Aliás, poderia ter acabado no tempo regulamentar. Houve ainda um sopro de esperança, os pênaltis. Mas, de certo modo, encaro aquele momento mais como um tributo, uma homenagem por parte do imponderável, dos deuses do futebol, a Rogério Ceni. Foi oferecido a ele, com toda as honras que merece, o palco para o seu “Canto do Cisne”, sua última obra no torneio que é sua obsessão. Fez sua parte magistralmente e saiu de cabeça erguida, embora com um nó na garganta do tamanho de uma melancia. Quase chorou ainda no gramado.

E ele merece um parágrafo inteiro, pelo menos. Tenho minhas reservas com a idolatria que gira em torno de Rogério Ceni, mas são admiráveis a gana e o compromentimento deste sujeito. Se todos sofressem como ele, talvez algumas de nossas maiores decepções tivessem se transformado em alegrias. Lutou até o fim por um sonho que parecia ser só dele e nosso. Foi um bravo! Está longe de suas melhores condições. Não treina mais como antes, não tem mais o vigor de antes, não está na mesma forma física do seu auge. Mas apresentou-se para a guerra e combateu o bom combate com as armas que tinha e se tem alguém que tombou honrosamente naquela noite, foi ele. Valeu, Rogério!

O elenco

Há momentos que penso em uma reformulação geral, ficando alguns poucos. Tem horas que penso que isso já foi feito… Então passamos a conhecer, via imprensa, certas atitudes desagradáveis que nada de positivo somam ao time, que refletem mal no elenco. E de modo sucessivo, reincidente. Uma, duas, três… Várias vezes. “Beicinho”, “mimimi”… Então realmente chega-se a conclusão que é, de fato, melhor “deixar ir”. Não é assim que ocorre, há contrato, deve obviamente haver alguma compensação financeira, contudo penso ser melhor para todos. Luís Fabiano, por exemplo: eu gosto muito dele. Não acho correto chamá-lo de pipoqueiro. Não é. Como também não é tão decisivo quanto Serginho Chulapa, a quem perseguiu, sem sucesso, na artilharia tricolor. Não conseguiu render o que esperávamos. Ele mesmo esperava mais de si próprio, imagino. “Não rolou”. Pois é, acontece. A vida é assim. Mas não se justificam suas últimas declarações à imprensa, seu descontentamento com a reserva, a sua irritação com um companheiro de clube, como no caso com Pato. É o caso de “deixar ir”. Será melhor para todos. Outros deverão ir por deficiência técnica. Ainda acho que Ganso não faça jus à barca. Tal qual Pato. É o caso de serem testados dentro de uma outra concepção de futebol, por outro treinador que traga um novo jeito de jogar, que treine, que oriente… Agora, é fato: dizer quem vai e principalmente quem chega, só depois da vinda do novo treinador. Qualquer coisa diferente disto é colocar a carroça na frente dos burros.

O treinador

Já falei aqui que, pelo imponderável, pelo tal “Sobrenatural de Almeida”, tenho a sensação de que Luxemburgo poderia fazer um bom trabalho no tricolor. É mais fé que qualquer outra coisa. Até porque a fé, como sabemos, ignora solenemente os números, dá de ombros para os mais racionais prognósticos.

A vontade, mesmo, é ver o futebol do tricolor ser reinventado, revolucionado, atualizado. Vou mais além: o futebol brasileiro precisa disto tanto quanto o São Paulo. Isso só seria possível, a despeito de minha turva visão atual das coisas, com um treinador estrangeiro. Em que pese os melindres da adaptação em um novo país, é o remédio necessário. Sobretudo porque, se a experiência se impõe pela causa, é o São Paulo, como um todo, que precisa se encaixar nos moldes propostos pelo novo treinador, não o contrário. Que o São Paulo se adapte, por mais difícil que seja. A ideia de que é o treinador quem deve se aclimatar ao clube, hoje, não passa de visão assoberbada dos fatos e, portanto, danosa, inútil. Ou então que se contrate “mais do mesmo” para as coisas continuarem como estão, em franca espiral negativa, queda livre.

Dentre os especulados, ficaria com Osorio. Pelo que vi de seus times, pelos resultados práticos, é a escolha lógica. Oremos!

A Direção

O tópico ideal seria “sem direção”. É bastante provável que grande parte da decepção com o São Paulo de hoje advenha de ações da direção do tricolor. Tudo o que queríamos era o oposto do que tem sido mostrado até o momento. Somos exigentes, é verdade. Todavia, não esperávamos nada diferente do que reza a própria investidura do ofício administrativo sob as boas práticas. Considerando os trunfos de nossos rivais ante o tricolor e traçando um paralelo comparativo, é irreal cobrar títulos, assim como também é surreal exigir uma nova arena sabendo da situação do clube, principalmente analisando a retração do mercado, a situação do país etc. Mas é perfeitamente factível exigir discrição, sobriedade, austeridade, astúcia, criatividade, seriedade, lisura, modernidade, vanguarda, conformidade (não conformismo!)…

Aidar tem sido decepcionante, tal qual Juvenal foi depois da mudança no estatuto (que, não esqueçamos, fora articulada pelo atual presidente). A mais recente “situação estranha” veio por informação da imprensa de uma comissão paga a uma empresa sediada na Coreia do Sul, supostamente com objeto social/atividade totalmente estranho à intermediação de contratos de patrocínio esportivo ou atividade que o valha. Pode ter sido uma transação plenamente legal. Porém, balizar-se somente pela Lei não é o bastante, ainda mais quando se está à frente de uma entidade com o legado que o São Paulo possui. É vital centralizar as ações diretivas dentro de um contexto de moralidade, ética e, por fim, considerando o custo-benefício para a entidade. À mente me vem aquele famoso ditado: “À mulher de César não basta apenas ser honesta. Ela deve, também, parecer honesta”. Está dentro da Lei? É moral? É ético? Se a resposta é sim para todos os questionamentos anteriores, por fim é vantajoso para o São Paulo?

Eu ainda estou esperando tudo o que o presidente disse que seria o seu governo. Pelo andar da carruagem, difícil. Mas não impossível.

E, se comecei com Latim, termino por ele, e em voz de comando. É, além de uma mensagem de esperança, uma ordem: “PRO SAO PAULO, FIANT EXIMIA” (A favor do São Paulo, façam o melhor)

Por: Paulo Martins